Notas Biográficas
Nasceu em 11 de dezembro de 1910, na Rua Teodoro da Silva n°. 30, hoje n°. 392, em Vila Isabel. Era filho de Manuel Garcia de Medeiros Rosa e Martha Corrêa de Azevedo. Por parte de pai era neto de Manuel Garcia da Rosa e Belarmina de Medeiros e, por parte de mãe, de Eduardo Corrêa de Azevedo e Rita de Cássia Corrêa de Azevedo. Seu nascimento foi difícil, pesava quatro quilos. Os médicos, diante das dificuldades do parto, resolveram usar o fórceps. O menino foi extraído a ferro e traumatizado com fratura do maxilar inferior, originando o defeito que se acentuava à proporção que crescia. Várias foram as tentativas de correção, sem sucesso.
Noel crescia frágil e mirrado. Amava a rua, a confusão dos amigos, as pipas, os piões e os balões. Era, também, artista de estribo de bonde. Menino alegre e de gênio bom. Os saraus em sua casa eram constantes. Sua mãe tocava bandolim; seu pai, violão; sua madrinha, piano; sua tia, violino. As crianças participavam, ouvindo. Foi dona Martha quem iniciou Noel na música ensinando-lhe a tocar bandolim, entretanto, ele sentia-se fascinado por qualquer instrumento, qualquer música e qualquer dança. Seu grande e único sonho era a música.
Noel, aos quatorze anos, já abusava do cigarro, da cerveja, e dos balaústres de bonde onde externava sua malícia, seu deboche, suas graças imaginativas e obscenas.
Tocava violão como ninguém. Amava, cada vez mais, a música e a poesia.
Era ex-aluno do Colégio São Bento e chegou a frequentar o 1°. ano da Faculdade de Medicina.
Fazia ponto no Café Vila Isabel, do Carvalho, local onde fez grande parte de suas composições, nas madrugadas. Era ali que o encontravam ou deixavam recados para que fizesse serestas e serenatas.
Noel Rosa começa a aparecer com o “Bando de Tangarás” do qual era um dos componentes. Sua primeira aparição em público foi a 27 de junho de 1929, no Tijuca Tênis Clube. Tinha, nessa época, apenas 18 anos.
“Com Que Roupa?”
Ainda em 1929, foi lançado no teatro, como compositor, por Eratóstenes Frazão que era jornalista, ator teatral e compositor. Noel já estava com 29 músicas compostas, inclusive “Com Que Roupa?” cuja melodia foi modificada por Homero Dornellas e a letra melhorada por Nássara, seu grande amigo. “Com Que Roupa?” retratava o Brasil da época, cheio de dificuldades, com o povo quase na miséria. Segundo Noel, o “Brasil de Tanga”. O samba explode em todo o país no carnaval de 1930 e aparece na boca do povo, surpreendendo até seu autor. A expressão – com que roupa? – passou a fazer parte do vocabulário do carioca, nas dificuldades. Aconteceu que, antes mesmo do sucesso o cantor Ignácio Guimarães ofereceu a Noel a importância de l80 mil réis pela aquisição da música, o que foi aceito. Dessa forma, o cantor tornou-se dono do samba mais cantado no Brasil. A partir do “Com Que Roupa?”, Noel compôs sem limite. Bastava surgir um tema para que nascesse uma letra de música.
Esquisitices e a Doença
Noel tinha suas esquisitices, uma delas era não gostar de andar em grupo, motivo pelo qual se afastava, quanto podia, do “Bando dos Tangarás”. Queria ser independente.
A época era favorável à música nordestina por isso todos a cantavam, inclusive os “Tangarás” e Noel Rosa.
Apresentou-se com Renato Murce, fazendo uma embolada que recebeu o nome de “Perna Bamba” mas verificam que sua vocação não estava nesse tipo de música. Era carioca, portanto, do samba.
O carnaval, em Vila Isabel, era um dos melhores do Rio de Janeiro. O bairro além das Batalhas de Confete competia com blocos de outros bairros em desfiles com premiações. Vila Isabel possuía dois blocos: o Cara de Vaca, formado pela turma da Rua Souza Franco / Torres Homem; e o Faz Vergonha, formado pela turma da Rua Maxwell, próximo à Fábrica Confiança, do qual Noel fazia parte. Dizem que o nome do bloco originou-se do comportamento de Noel Rosa que estava sempre com brincadeiras, fazendo vergonha.
Em Vila Isabel nasceu o bloco dos Vassourinhas (vide errata abaixo), bloco de frevo, dirigido pelo sr. Luís Alves.
Da Rua Petrocochino saía o bloco de Reis.
Noel começa a emagrecer e demonstrar cansaço. Dona Martha observa o filho e se preocupa, mas não consegue tirá-lo da rua nas madrugadas.
Dr. Edgard Graça Mello, médico da família, é chamado e detecta a doença: estava com lesão no pulmão direito e já começando no esquerdo.
Noel amava as mulheres. Seus grandes amores foram, Clara Corrêa Netto, Fina (Josefina Telles Nunes) e Ceci (Juraci Correia de Morais) por quem se apaixonou, verdadeiramente. Casou-se, entretanto, com Lindaura, uma sergipana que morava na Rua Maxwell, 74 casa 2, no dia 1°. de dezembro de 1934.
Foi nos braços de Lindaura que Noel Rosa faleceu em 4 de maio de 1937, na mesma casa onde nasceu, aos 27 anos.
A Imprensa
Diário da Noite, 5 de maio de 1937
Morreu Noel Rosa. Após alguns minutos, a cidade inteira já sabia. Noel o popular cantor e compositor dos morros da cidade que sempre se destacou pelas suas producções, deixa a vida para ir de encontro a um novo mundo.
De algum tempo para cá, Noel deixou de aparecer nos meios radiophonicos e recolheu-se a um sanatorio atacado por terrivel enfermidade. Os seus “fans” reclamaram; porém, Noel não podia attendê-los por ter necessidade de absoluto repouso.
Suas melhores producções, alías, a que lhe deu nome, foi ha alguns annos o samba “Com Que Roupa”. Depois, seguiram-se outros, e ultimamente “João Ninguem”, “De Babado Sim” e outros.
Encerra-se com o autor de “Pierrot Apaixonado”, “Feitiço da Villa”, “Palpite Infeliz” e outras composições populares, uma etapa verdadeiramente brilhante do samba de nossa terra.
Noel morreu subitamente em consequencia de um colapso cardiaco, quando na rua Theodoro da Silva n. 382, o querido compositor encontrava-se em companhia de sua progenitora, esposa e alguns amigos palestrando recostado no leito. (…)
Cerca de 23 1/2 horas, o “sambista philosopho” pediu que fosse tocada uma das suas composições, no que foi attendido promptamente. Então, cantando “De Babado Sim”, Noel repentinamente deixou de viver desapparecendo da vida e deixando saudades. Porém, suas musicas não serão esquecidas e a sua memória será tão venerada como a dos nossos maiores compositores da musica popular.
O seu enterro será realizado hoje á tarde, saindo o feretro da rua Thedoro da Silva n. 382 em Villa Isabel.
Diário de Notícias, 5 de maio de 1937
Noel Rosa era um de nossos mais conhecidos compositores populares. Suas musicas nunca deixavam de alcançar sucesso nas temporadas carnavalescas.
Havia mezes vinha elle soffrendo de pertinaz molestia, que lhe tirava toda a alegria.
Hontem, á noite, em frente á sua residencia, á rua Theodoro da Silva, 382, em Villa Isabel, realizava-se uma festa familiar.
Os rapazes, que compunham a orquestra, resolveram prestar uma homenagem a Noel, cantando em voz alta, o samba-desafio, de sua autoria, intitulado “De Babado Sim…”
O compositor popular, que regressára havia tres dias, de Pirahy, onde fôra mudar de ares, ao ouvir a musica, teve um estremecimento e morreu, talvez de emoção.
O seu enterro será realizado hoje á tarde, sahindo o feretro do endereço acima.
O Jornal, 5 de maio de 1937
Á meia-noite de hontem falleceu, nesta capital, em sua residencia, á rua Theodoro da Silva, 382, o compositor de sambas e marchas, Noel Rosa.
Era uma figura sympathica das rodas radiophonicas e dos nossos musicistas mais populares.
Muitas de suas producções como “Tarzan, O Filho do Alfaiate” e “Maria Fumaça”, tiveram um exito extraordinario. Mas o seu samba que mais agradou, foi, sem duvida, “Palpite Infeliz”. De alguns annos para cá, não havia Carnaval completo sem musica de Noel Rosa.
Encontrava-se elle enfermo ha varias semanas e os que o conheciam nada auguravam de bom, dado o seu physico franzino. Entretanto, ainda recentemente, concedeu uma alegre entrevista a uma de nossas revistas de radio, traçando então os seus planos para o futuro. Não quiz o destino que se justificasse o seu optimismo.
O enterro sae, ás 16 horas, de hoje, do referido endereço, para o cemiterio de S. Francisco de Assis.
A Noite, 5 de maio de 1937
Morreu Noel Rosa. A cidade chora, nesta noticia, o desapparecimento do expoente maximo do sambista carioca.
A letra era repleta de uma philosophia humana. Sentira a necessidade de ambientar a musica que vivia nos morros ao convivio da cidade. Fez letras onde o malandro e o jogo de chapinha não entravam. Traduzia a propria vida em ritmos e melodias.
É seu esse samba canção: “Naquelle tempo em que você era pobre / Eu vivia como nobre / A gastar meu vil metal / E, por minha vontade / Você foi para a cidade / Esquecendo a solidão / E a miseria daquelle barracão./ Tudo passou tão depressa, / Fiquei sem nada de meu / E esquecendo a promessa, / Você me esqueceu, / E partiu, com o primeiro que appareceu / Não querendo ser pobre como eu.” Dizem que essa historia foi vivida.
O morro era para elle motivo de verdadeiras chronicas musicais. “Mangueira” é um exemplo disso.
Seu primeiro sucesso foi “Com Que Roupa”. Nesse tempo, prosseguindo os estudos, elle ingressava na escola de Medicina. Em pouco tempo, porém, abandonava os estudos, dedicando-se, inteiramente, á arte que o empolgára. Venceu, em toda linha, plenamente, quer como autor quer como violonista. Costumava, constantemente, interpretar, frente ao microphone, suas producções. É enorme a sua bagagem musical.
Noel Rosa morreu, victimado por um collapso cardiaco, em sua residencia, á rua Theodoro da Silva. E – suprema ironia do destino!
Correio da Manhã, 6 de maio de 1937
A cidade, principalmente, os meios bohemios, sentiram deveras a morte de Noel Rosa, o festejado sambista e cantor de radio, em plena mocidade. Sem obter melhoras no Piauhy, Noel Rosa regressou a esta capital para succumbir entre os desvelos de soa veneranda mãe e de sua esposa. Na hora da agonia, ouvindo os acordes de uma orchestra proxima ao seu leito de dôr, mandou pedir a execução de um samba de sua autoria e logo depois expirava.
O autor de “Com Que Roupa”, “Cidade Mulher”, e outras canções que alcançaram sempre popularidade, era filho de Villa Izabel, tendo nascido em 1907, á rua Theodoro da Silva n. 380, filho de Manoel de Medeiros Rosa, já fallecido e de d. Martha de Medeiros Rosa. Era casado com d. Lindaura Rosa.
Na sua mesa de trabalho, no momento da morte, estava exposto que confeccionava d. Martha Rosa, a partir de 1929, contendo todas as criticas da imprensa ás composições literarias e musicaes de Noel Rosa. Mesmo aquelles contendo irreverências á pessoa do vate nelle estão collecionados, contornados de vermelho, para maior realce.
Noel, cercado de amigos e de companheiros de aventura, reconheceu a proximidade da morte e dirigindo-se a Orestes Barbosa advertiu:
– Seu amigo está acabado…
Momentos depois era fulminado por um collapso.
O enterramento do festejado cantor e compositor teve grande acompanhamento tendo sido a sepultura aberta no cemiterio de S. Francisco Xavier.
Diário Carioca, 6 de maio de 1937
O povo carioca perdeu hontem com a morte de Noel Rosa, um dos interpretes mais perfeitos da sua poesia.
Poeta instinctivo, observador profundo da vida das populações pauperrimas da cidade, Noel Rosa, compreendeu, logo no inicio de sua vida de homem a necessidade que havia de realçar-se a lidima poesia popular da terra, a despeito de toda a miseria que assoberbava o modo de viver das populações dos bairros mais afastados da cidade. E foi com a intenção perfeita de enquadrar no seio da musica folklorica do paiz as producções do povo da cidade, que esse menestrel moderno levou para o radio a melhor somma de suas composições, todas ellas feitas sobre motivos da vida real dos habitantes dos morros e dos longinquos suburbios do Rio.
Noel Rosa deixa uma lacuna no seio da representação da musica popular do Rio de Janeiro. Elle, unicamente elle, compreendia e satisfazia o desejo do povo no tocante a arte dos sambas e das canções populares desta terra.
O enterro de Noel Rosa realizou-se hontem, com grande accompanhamento, sendo o seu corpo sepultado no cemiterio de S. Francisco Xavier.
Discografia Recomendada
Aqui estão alguns discos que podem ajudar a conhecer melhor a obra deste grande nome da música brasileira. O objetivo aqui não é de ser completista, mas simplesmente procurar mostrar a diversidade desta obra e suas mais diversas abordagens, incluindo comparações com outros compositores. Os títulos abaixo já apareceram no mercado em formato de CD (exceto onde indicado) mas podem estar esgostados agora.
- Aracy de Almeida: Canções de Noel Rosa com Aracy de Almeida, Continental LPP10 (1955) – vinil apenas.
- Francisco Egydio & Roberto Paiva: Polêmica – Noel Rosa & Wilson Batista, Odeon MODB 3033 (1956).
- João Nogueira: Wilson, Geraldo, Noel, Polydor 531948-2 (1981).
- Songbook Noel, Lumiar Discos 107.127 (1991).
- Mário Reis & Aracy de Almeida: Noel Rosa por Mário Reis e Aracy de Almeida, Revivendo RVCD 027 (1993).
- Noel Rosa: Feitiço da Vila, Revivendo RVCD 052 (1994).
- Noel Rosa & Vadico: Inédito e Desconhecido / Vadico , Eldorado 924041 (1995).
- Noel Rosa: Coisas Nossas, Revivendo RVCD 106 (1995).
- Noel Rosa: Coisas Nossas, Leblon Records LB 060 (1996).
- Ivan Lins: Viva Noel, Velas 11-V230 (1997).
- Olibia Byington: A Dama do Encantado – Tributo a Aracy de Almeida, MP,B 398420455-2 (1997).
- Johnny Alf & Leandro Braga: Letra & Música Noel Rosa, Lumiar Discos LD 05/97 (1997).
- Noel Rosa: Que Se Dane, Revivendo RVCD 139 (1999).
- Ione Papas: Noel Por Ione, Dabliú DB-0084 (2000).
- Zé Renato: Filosofia – Sobre as Músicas de Chico Buarque e Noel Rosa, MP,B 325912003262 (2000).
- Noel Rosa: Noel Pela Primeira Vez (7 CDs), Velas 32591 2000682 (2000).
- Cristina Buarque & Henrique Cazes: Sem Tostão 2… A Crise Continua – Canções de Noel Rosa, Kuarup KCD 153 (2001).
Errata Correção segunda a senhora Claudete Umbelino de Oliveira: O nome do bloco era Lenhadores. (18 de março de 2008)